Comunidade Emanuel do Brasil

“Podemos viver felizes pelo simples fato de vivermos com Deus” Dois jovens confinados em uma paróquia rural testemunham

Clarisse e Alexandre, jovens membros da Comunidade Emanuel ficaram confinados em uma paróquia rural, na Paróquia Notre-Dame de Neufchâtel (Nossa Senhora de Neufchâtel) na Normandia. Eles testemunham sua experiência.

Alguns elementos para contextualizar:

O confinamento missionário nas paróquias rurais foi uma operação inédita, organizada pela Missão Isidore[1] e pela Missão Wemps[2] durante o segundo confinamento 250 jovens foram enviados para 61 paróquias em toda França.

Na Normandia, quatro jovens foram enviados para as paróquias de Londinières e Neufchâtel-em-Bray que estão sobre o encargo do Padre Sebastien Savarin, e que possuem quatro capelas.

[1] A Missão Isidore é um projeto da Comunidade Emanuel na França que permite a experiência de voluntários a serviço de uma paróquia rural na França, por seis meses, um ano ou mais. Os três pilares da missão: oração, serviço, missão. Eles vivem no quadro de uma vida fraterna de uma equipe de voluntários, no coração do cotidiano de uma paróquia francesa. Esta missão assume do nome de Santo Isidoro, o lavrador, trabalhador agrícola e santo padroeiro do mundo rural.

[2] Wemps = WEEK-ENDS MISSION PRIÈRE SERVICE = Final de Semana de Missão Oração e Serviço.

O que é que vos atraíram nesta missão numa paróquia rural?

Alexandre: No início da pandemia eu tive um grande desejo em mim, de me doar de uma maneira outra. Eu então pedi ao Senhor que este tempo fosse fecundo para Ele e para os outros. Eu não queria andar em círculo em torno de mim mesmo durante um mês e me instalar em minha rotina confinada.  O que eu não tinha feito! Deus respondeu a este desejo e colocou a missão WEMPS no meu caminho. No dia mesmo da partida eu soube que eu passaria o mês seguinte em uma pequena vila que eu não conhecia, na casa de um pároco que eu não conhecia, com jovens que eu não conhecia. Eu acredito que o Espírito Santo verdadeiramente trabalhou no sentido para que a decisão de partir fosse fonte de grande paz e alegria, na certeza de faria o que era bom e justo. O desconhecido da missão me permitiu viver plenamente esta alegria do abandono e da confiança.

Clarisse: Eu tinha ouvido falar do WEMPS, mas eu nunca pude participar. Quando eu recebi esta proposição de confinamento missionário, eu me disse que era o momento de descobrir e viver este tempo de restrição, que eu vivia como uma série de negações, de uma forma positiva. A ideia de transformar este confinamento em um tempo de serviço me entusiasmou. Eu tinha um pouco de medo de partir para um lugar desconhecido, com pessoas desconhecidas, principalmente num contexto de confinamento. Mas eu fiquei feliz por fazer esta aposta de aventura cristã!

 

Em que consistiu esta missão?

Alexandre: A « missão » tomou formas diferentes. Primeiramente, nas pequenas coisas do cotidiano: a vida fraterna e a atenção para cada um e com cada um, a fidelidade nos tempos de orações comunitárias de manhã e a noite, os serviços (compras, refeições, limpeza…) foram antes de tudo belos lugares de missão e de dom de si, muitas vezes exigentes, sempre formadores.

Depois teve a missão, propriamente dita para e na paróquia Rural que girou em torno de duas coisas: o serviço e a oração. O serviço consistiu em se fazer presente para visitar pessoas isoladas ou idosas, repintar a sala de catequese e ordenhar as vacas da fazendo vizinha. A oração é levar as almas a Deus e Deus às almas. Neste sentido, a missão na paróquia rural teve um profundo significado evangélico, no sentido em que ela foi fiel ao ministério de Nosso Senhor. Jesus é antes de tudo aquele que visita: « Zaqueu, desce rápido, é preciso que hoje eu vá e fique contigo ». Por isso foi uma alegria profunda levar a comunhão às casas de quem desejou. Mas Jesus é também aquele que acolhe incondicionalmente, e que escuta o grito do cego « Senhor, Filho de Davi, tem piedade de mim ». Todos os sábados de manhã, nós trabalhamos na Igreja da vila para que houvesse uma manhã de oração animada por nós. O Santíssimo Sacramento foi exposto e vários passos foram propostos: retirar um versículo bíblico, deixar uma intenção de oração, receber a comunhão… E mesmo tomar um copo de cidra quente na saída! Neste tempo de missão, foi bom se afastar o máximo possível para deixar o espaço para o Espírito Santo, para eles poderem se entregar a Ele no meio de todo desânimo.

Clarisse: Nossa missão consistia antes de tudo assegurar uma presença cristã na paróquia neste momento em que a paróquia não podia mais se reunir. Nossa primeira missão foi ter uma vida de oração cotidiana, ritmada pela liturgia das horas, ocasião de rezar com o padre pela paróquia. Uma segunda missão: viver a fraternidade cristã entre nós, já que a vida comunitária foi frequentemente o primeiro lugar para exercitar a caridade! A terceira missão: foi o nosso dever de estado, pois cada um de nós tinha um teletrabalho durante o dia. Nossa quarta missão foi o serviço aos paroquianos: levar a comunhão, visitar as pessoas isoladas, animar uma missa fúnebre, animar e difundir a missa dominical, repintar a sala da catequese. No sábado de manhã, dia de mercado, nós assegurávamos um manhã de oração na Igreja e propúnhamos as pessoas para entrarem e dar um tempo de oração na igreja.

 

O que é que vocês guardaram deste tempo de proximidade com um padre?

Alexandre: Longe da agitação da cidade e dos problemas do mundo eu encontrei um padre totalmente entregue, fiel e obediente ao Nosso Senhor, no segredo de uma vida bem ordinária.  Diante da situação de uma paróquia rural, eu admirei a solidez de seu compromisso e de sua capacidade de ir em frente. Admirável o poder do céu revelado na fragilidade dos homens! Uma palavra de Jesus me habitou durante todo este mês: « Aquele que coloca a mão no arado e olha para traz não é feito para o Reino de Deus ». Quando vemos algumas situações numa paróquia rural, pode ser muito tentador para um padre « olhar para trás » e até mesmo « largar o arado »… Eu pressenti que tal abnegação só poderia vir de algo muito mais poderoso e profundo que nossas pequenas forças humanas. Eu vi que os padres das paróquias rurais são sobrecarregados e que a Igreja do campo é uma, e talvez a primeira, terra de missão que nós não podemos esquecer. Esta Igreja, que também é a nossa, precisa de nós, sobretudo de nossas orações.

Clarisse: isso foi uma das coisas mais belas que experimentei durante este tempo de confinamento. A convivência cotidiana com um sacerdote me permitiu ver um pouco o que é que pode ser sua vida em uma paróquia rural e descobrir como é essencial que todos, tanto leigo como padre, assuma sua parte da missão da Igreja. Eu fiquei impressionada em ver como ele assume múltiplas missões, e, sobretudo, está sempre disponível para escutar os outros.  Eu retive também a bela paternidade que ele exerceu para conosco, sempre muito atento a nossas necessidades tanto materiais como espirituais. Ele insistiu que nós tivéssemos uma noite de oração entre nós cada sexta-feira, na véspera da nossa manhã de oração na Igreja, para que nós recebêssemos do Senhor aquilo deveríamos transmitir no dia seguinte, o que nos ensinou o quanto é necessário permanecermos enraizados no Cristo se é que queremos anuncia-lo e não anunciar nós mesmos. Vê-lo feliz em nos ver e ouvir relatarmos as missões da animação das manhãs de oração na Igreja ou sobre o serviço de levar a comunhão (algo que ele nunca poderia fazer levando em conta sua agenda repleta). Isso me fez ver o quanto nós leigos, podemos também ter um papel essencial para levar o Cristo a todo mundo e a tornar a nossa Igreja muito mais acolhedora.

 

Qual é o papel de um jovem no serviço de uma paróquia rural onde já existe uma organização local?

Alexandre: O problema é que justamente, a organização local está longe de ser a regra nestas paróquias…

O pároco muito frequentemente costuma carregar sozinho com seu braço às várias capelas e os paroquianos no meio rural, cuja média de idade é muito elevada, têm dificuldades em se implicarem pessoalmente. Pelo zelo por seus compromissos, eu creio que os jovens estão em condições de renovar os recursos humanos e espirituais da paróquia e levar sua pedra a um edifício frequentemente pobre e frágil.

 

Clarisse: O padre ficou muito feliz por ter reforços. Nós pudemos estar em contato com os responsáveis pela equipe paroquial que nos permitiu receber as coordenadas das pessoas sozinhas para visitar e distribuir algumas informações. Nós não teríamos podido ir ao encontro de algumas pessoas sem estas redes existentes, porque estas pessoas teriam tido receio de acolher jovens estranhos vindos de fora.  Percebemos muito entusiasmo da parte de muitos paroquianos em ver jovens, principalmente nas manhãs de oração na Igreja. Frequentemente, eles ficam tristes por ver seus netos viverem sem a fé e nossa simples presença pareceu ser um sinal de esperança para eles. As crianças do catecismo, com quem o padre tinha vídeos todas as semanas, ficaram igualmente felizes em nos ver chegando para cumprimenta-los na tela! Uma das coisas que não foi fácil para nós foi compreender que tínhamos que adaptar nossa comunicação. Por exemplo, para a primeira manhã de oração que nós organizamos, nós colocamos na página do Facebook da paróquia um anúncio com uma bela imagem do Santíssimo Sacramento exposto. O padre Sébastien rapidamente nos faz compreender que seus paroquianos não compreenderiam a maior parte da mensagem, porque eles não sabiam o que é que era a adoração. Por outro lado eles tinham uma grande devoção pela Virgem Maria e eram muito sensíveis ao culto dado aos defuntos. Então nós focamos esta manhã de oração para confiar os entes queridos, especialmente os defuntos, na oração da comunidade. Isso tornou necessária uma adaptação, tanto na escolha dos cânticos, como nos tipos de oração.

 

Qual foi a maior alegria que vocês guardarão deste tempo de missão?

Alexandre: Eu guardo, sobretudo, uma grande alegria na pobreza e na simplicidade: nosso modo de vida e nossas missões não tinham nada de extraordinário, nós não reivindicamos nada, nem possuímos nada, nem pegamos nada. Tudo o que nós fizemos foi colocar-nos a disposição da missão, para a glória de Deus e para os outros. Isso foi fonte de uma grande alegria, e eu senti um apelo urgente à simplicidade de vida, arrancando as mil pequenas preocupações superficiais nas quais eu posso facilmente me fechar.

Também tive a alegria da confiança: depois das missões, o cansaço era às vezes sentido, mas elas eram uma fonte de alegria. A alegria de simplesmente ter semeado, e de deixar o crescimento para o Senhor. A alegria de ter entreaberto a porta do céu, para deixar que a graça se espalhe nos corações. Mesmo se os frutos são invisíveis, nós somos chamados a este belo ato de fé de que é através de nós, mas tudo é realizado somente por Deus.

 

Clarisse: Eu fiquei maravilhada em ver que eu podia ser uma pessoa feliz e realizada em um lugar desconhecido, convivendo com pessoas que eu não conhecia, mas com os quais eu estava reunida em nome de Deus. Eu me dei conta que vivendo unida a Deus e estando ao seu serviço, com irmãos e irmãs cristãs, eu podia ser feliz e realizada.  Foi uma experiência muito libertadora ver que fora do nosso conforto pessoal, do nosso casulo familiar e amigável, podemos viver felizes pelo simples fato de viver com Deus, para servi-Lo e servir nossos irmãos e irmãs. Eu também parto com alegria do serviço, eu pude ver o quanto eu estava feliz, mesmo que cansada, e principalmente sem o nosso conforto. Eu fiquei impressionada por ver como cada vez que nós fazíamos uma visita, nós saíamos cheios de alegria (e frequentemente com os braços carregados, as pessoas foram muito generosas conosco)!

 

Alguma coisa a acrescentar?

Alexandre: Uma vida doada é uma vida feliz! A simplicidade de uma vida em Deus preenche muito mais que todos os tesouros do mundo. Não tenham medo de oferecerem na humildade daquilo que nós somos: pequenos e pobres, no lugar onde estivermos, no nosso cotidiano, tão sem graça e rotineiro quanto parece! É isso que transforma nossa vida e as vidas das outras pessoas.

Clarisse: Cada um é essencial para sua paróquia, para que o Cristo possa ser anunciado em todos os lugares, para todos os homens, mesmo se temos a impressão de que não fazemos nada de extraordinário.


https://emmanuel.info/vivre-heureux-vivre-avec-dieu-jeunes-confines-paroisse-rurale/

https://youtu.be/jUV4JezTpkQ?t=406  (vídeo em francês, mas as imagens ajudam a ver um pouco como foi a missão)

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